No aniversário de 5 anos do blog, uma homenagem ao inolvidável Dequinha, conterrâneo ilustre.
Do Blog: SELETA DE PROSA
Do Blog: SELETA DE PROSA
Fonte: http://seletadeprosa.blogspot.com.br/2009/09/o-mais-querido-tem-rubens-dequinha-e.html
O Flamengo é uma
das minhas grandes paixões. De 1980 pra cá, muito da história da minha
vida passa pelo clube. E não é só o futebol não: os esportes ditos
"amadores" também. Já me emocionei muito com o basquete, com o vôlei,
judô e natação do Flamengo. Já varei a madrugada tentando confirmar o
resultado do Remo rubro-negro. Reverenciei ídolos que nunca vi em
quadra, piscina, tatame ou campo. Chorei, ri, chorei de rir, ri de
chorar, acompanhando o clube. Já parei (com mais 04 gatos pingados) uma
das maiores avenidas daqui de São José dos Campos (SP - terra do
primeiro quiosque do Flamengo
fora do RJ) pra comemorar o penta (sim, penta) em 92. Mas não é disso
que quero falar. Aliás, é do Flamengo sim, mas de uma personagem em
especial: José Mendonça dos Santos, o Dequinha (nascido em Mossoró, RN, a 19 de março de 1928).
Dia
desses, aniversário familiar. O pessoal conversando e eu meio de canto.
Até que um tio, desses que a gente só vê em festas familiares, puxa a
cadeira e senta ao meu lado. Cabelos branquinhos, fala pausada.
- E o nosso Flamengo, hein?(mal acreditei que o Flamengo fosse virar assunto ali, aquela hora!)
- Ah, tá melhorando... o Andrade parece que conseguiu, com aquele jeito manso dele, acalmar aquele caldeirão.
-
‘Tamo’ com uns reforços bons... o Maldonado é bom, aquele negrinho (o
Álvaro, tio) chega junto na zaga. E o Pet quer calar a boca de uns e
outros aí...
- Verdade. Pena o time ter engrenado tão tarde...
-
Rapaz, você me falou do Andrade e eu me lembrei de outro. Eu nasci em
Minas, mas por causa do Flamengo sempre tive a obsessão de morar no Rio.
O que consegui realizar em 1951, porque fugi de casa e me alistei no
exército no (não me lembro o número) batalhão, lá.
- Sério?
-
Sério. Meu jovem, o futebol era uma coisa linda de se ver mesmo. E não
falo de estratégia ou tática, ou essas modernices, nada disso. Era
plasticamente bonito! A bola era mais bem tratada que muita dama,
hahaha...
- Imagino, às vezes penso nisso. Mas de quem o senhor lembrou?
- Bem, indo para o RJ em 1951 e apaixonado pelo Flamengo... você ouviu falar do tricampeonato de 53, 54 e 55?
- Opa, claro!
Pausa.
Como qualquer rubro-negro que se preze não teria ouvido falar deste
feito? Como um time perde de 5 x 0 o segundo jogo da final, tem o
presidente morrendo na véspera do jogo decisivo (o grande Gilberto
Cardoso pai, num tempo em que os presidentes eram os grandes líderes dos
clubes, infartara de modo inapelável após - mais um - título do
Basquete flamengo), como um time arranca forças para meter inapeláveis
4x1 e conseguir seu segundo tricampeonato (tão heróico quanto o
primeiro, graças ao grande paraguaio Valido, outro que merece uma
lembrança)? Só mesmo essa força da natureza chamada Flamengo. Mas volto
ao Tio Zé.
-
Bem, tão logo cheguei no RJ e me apresentei no batalhão, logo me juntei
aos rubro-negros e íamos sempre aos jogos, nas folgas. O Flamengo
realmente era maravilhoso, mas os outros também eram muito bons. E o
Flamengo tinha um centromédio, Dequinha, que era um monstro.
Dequinha! Quem não sabe sobre Dequinha, imortalizado no “Samba Rubro-Negro”?
“Flamengo
joga amanhã / Eu vou pra lá / Vai haver mais um baile / No Maracanã / O
mais querido / Tem Rubens, Dequinha e Pavão / Eu já rezei pra São Jorge
/ Pro Mengo ser campeão!”
Sobre
Dequinha: Dequinha formou com Rubens uma dupla de meio campo famosa na
década de 50. Rubens era o estilista, responsável pelas jogadas de gols.
José Mendonça dos Santos, o Dequinha (nascido em Mossoró, RN, a 19 de
março de 1928), encarregava-se de combater os adversários, tomar-lhes a
bola e proteger seus zagueiros. Uma excursão do América do Recife ao Rio
de Janeiro, em 1950, atraiu o interesse do Flamengo, que o contratou. O
investimento no maior centromédio do Norte e Nordeste valeu: Dequinha
tornou-se uma peça vital na campanha do segundo tricampeonato do
Flamengo, o primeiro no Maracanã. Dotado de incrível resistência física,
não se limitava a proteger a defesa. Depois de amortecer a bola - a
classe era tanta que parecia ter usado a mão - iniciava a arrancada pelo
espaço livre ou tocava de leve para alguém sempre bem colocado.
Raramente errava os passes e lançamentos longos. No Flamengo foi titular
absoluto até encerrar a carreira, em 1960. (fonte: www.nacaorn.hpg.com.br)
- Dequinha, sei sim.
-
Menino, eis algo que jamais esquecerei. Aquele Maraca lotado, pintado
de vermelho e preto. Então tinha um tiro de meta pro adversário. O
estádio emudecia! Emudecia tanto que a gente ouvia o bico do goleiro na
bola. E a bola procurava o Dequinha! Ele levantava o pé praticamente na
altura do pescoço, trazia a bola pro pé dele, como se usasse a mão,
levantava a cabeça e iniciava as jogadas. E aí ele tinha Rubens, Dida,
Joel, Zagalo, Evaristo, essa turma toda, pra tocar a bola. Por isso que
dói ver caneleiros envergando o manto. Eu sou de um tempo que nego suava
pra jogar com aquilo. No batalhão a gente brincava: preto era de tanta
lama, de os caras se jogarem na bola. Vermelho era o sangue que aquele
time suava. E os outros torcedores não podiam falar nada, porque quem ia
no estádio via aquilo tudo.
E o papo acabou indo pra seleção brasileira, outros chegaram na conversa. E eu tinha vivido um momento emocionante: o depoimento de quem esteve presente numa fase maravilhosa do futebol brasileiro e do Flamengo. Romântica, talvez. Mas maravilhosa. O Maraca cheirando a novo, os grandes jogadores tratando a bola como ela deve ser tratada. Homens de brio, paixão. Jogos épicos, esportividade e gentileza. E uma nação cuja história é a maior força para a conquista de um futuro com glórias merecidas.
Porque é assim: uma vez Flamengo, Flamengo até morrer.
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